quarta-feira, 26 de março de 2014

Rua das Flores - Curitiba



  
     Onde as flores? Perguntou um forasteiro caçoísta ao passar pela Rua das Flores.

     Escutando-o um curitibano pertinaz se apressou na resposta: Para vê-las é preciso ter sensibilidade. Olhe só, LÍRIOS na pureza do transbordamento artístico dessas crianças, pintando em papel estirado na calçada. Repare as ANGÉLICAS que vicejam na ingenuidade da meninada que fica brincando de aprender no bondinho parado, enquanto as mães, nas lojas fazem bisbilhotices.

     Veja essas GLICÍNIAS caindo em cachos de nostalgia, no beiral das sanfonas dos ceguinhos que enchem de alegria os ares em poluição. E que tal essas ROSAS a enfeitarem os lábios das mocinhas que espalham sorrisos de gentileza?

     Ó... HORTÊNCIAS , rechonchudas, no cadenciar dos passos apressados das velhotas afoitas. Aprecie as AÇUCENAS do semblante feliz dos casais a passearem em idílios que ninguém mais liga.

     Flores de CACTO espinhento são cultivadas nos bolsos dos homens de negócios, a correrem de Banco em Banco, esperançosos de que lhes seja conseguido um BOTÃO DE OURO, ou pelo menos algum COPO DE LEITE.

     E as MARGARIDAS...coitadas! Transvertidas em gente, às portas das casas de disco, embaladas pelas brisas musicais ficam a requebrar, confundindo-se com a bicharada que infesta o jardim.

     CAMÉLIAS se apresentam na altivez de gente bem, que só olha para VIOLETA DOS ALPES, por ser flor estrangeira e de estufa. ABSINTOS estão na tristeza dos solitários que buscam ALECRIM para o coração ficar feliz.

     LÍRIOS-DO-BREJO sobejam nos cartazes escandalosos das bancas de revistas, anunciando ainda PAPOULAS de viço chocante. Mas, olhe ali o AMOR-PERFEITO dos casais de velhinhos que cambaleantes, mas seguros nos bons princípios, procuram recordar o tempo de namorados voltando ao local de flert discreto, hoje substituído pela paquera imoderada.

     Há também no jardim da cidade flor que não se cheira... São as SEMPRE-VIVAS, que se exibem suscitando gracejos de CRISTA-DO-GALO, ou de algum GIRASSOL desocupado.

     Os CRISÂNTEMOS amarelos estão nas cabeleiras de nylon, tendo por vezes, como complemento BRINCO-DE-MULATA a experimentar a volúpia de um LOURO-AÇO indisfarçável.

     Os GOIVOS ROXOS florejam nas lamúrias dos saudosistas sentados nos bancos, vendo a SAUDADE passar.

     Tem mais... ORQUÍDEAS parasitando cafezinhos dos amigos que nem lembram mais de tal amizade. BOCA-DE-LEÃO aos montões, bem lá no final de tão esplendoroso jardim, mastigando os frangos do futebol que passou, os  pratos do dia da política, a sobremesa de qualquer um...e são tantas que chegam a formar um ramalhete singular: BOCA MALDITA.

     Só o curitibano consegue ver e entender essas flores humanas da

                                          RUA DAS FLORES

  Crônica escrita pelo Prof. Luís Piloto, 1976