quarta-feira, 28 de julho de 2010

O ideal de servir

Amigos do blog

No dia 31 de outubro de 1977, meu pai recebeu o título de Cidadão Benemérito de Morretes. Em seu discurso de agradecimento, publicado no livro Tenho dito, página 153, ele falou que pensava como Gabriela Mistral, que disse em um dos seus poemas:

Toda a natureza é um anelo de servir.
Serve a nuvem, serve o vento, serve a chuva.
Onde houver uma árvore para plantar, deves plantá-la tu;
Onde houver um erro a corrigir, corríge-o tu;
Onde houver um trabalho e todos se esquivam, aceitá-o tu (...)

Marquinhos, por Th. De Bona
O Ideal de Servir*

Onde com mais intensidade vivemos quando possuídos do ideal de servir? Nas grandes cidades ou nos lugares pequenos, geralmente pobres?
Eis uma pergunta que não é difícil responder, visto que nas cidades pequenas – é evidente – mais se faz necessária a assistência ao próximo e mesmo a mútua assistência.
Dirão outros que nos grandes centros afluem necessitados de todas as regiões, com penoso acesso e permanência, a procura de alimentos, medicamentos e trabalho, fugindo de situações desfavoráveis, muitas vezes insuportáveis, ingressando em sua maioria em bairros pobres, outros concorrendo para a formação de míseras favelas, que se tornam campo propício à aplicação da assistência social, quando da iniciativa do governo, e do desvelo de piedosas senhoras, ou de sociedades beneficentes, quando da iniciativa particular.(...)
Já nos sítios, nos lugarejos, nas cidades pequenas, o sentimento cristão de caridade se faz sentir em toda a plenitude (...)
Mas não é só com o que diz respeito à pobreza ou à doença que se exercita o ideal de servir. Por quantas outras razões e em quantas outras oportunidades se manifestam o sentimento da bondade,.o altruísmo? Poderia ser um ideal servir até como criado, se bons os patrões; servir em vários sentidos a amigos; utilizar-se da sabedoria para ensinar; do amor, para amar; valer-se da capacidade de curar, para minorar os sofrimentos físicos; buscar forças da razão para amparar moralmente; julgar, fazendo justiça. Finalmente, a conquista suprema do ideal de servir – consagrar-se aos serviços de Deus, da Pátria e da Família.

* Este artigo pode ser lido na íntegra na "orelha" do livro Tenho dito, e foi publicado no O Infalível, de Morretes, e no O Antoninense, em 1968.

domingo, 18 de julho de 2010

Professora Iracema Bittencourt


Hoje, dia em que o contador de visitas do meu blog registrou 1.000 acessos, quero agradecer a atenção dos meus leitores e homenagear D. Iracema Bittencourt.
Na memória registramos principalmente os fatos marcantes, aqueles que mais chamaram nossa atenção, e comigo não foi diferente. Eu tinha 7 anos e fui matriculada no velho Grupo Escolar Miguel Scheleder - Morretes - no prédio que depois abrigou o Ginásio Estadual Rocha Pombo. Como a escola estava com a capacidade esgotada algumas crianças foram transferidas para as salas de uma casa na Rua XV, inclusive eu. Era meu primeiro dia de aula e a D. Iracema, segurando minha mão, me levou para o novo endereço. Ao entrar na sala vi as carteiras duplas, e sobre elas um objeto desconhecido. Era um TINTEIRO - de louça - encaixado no tampo das carteiras. Eu muito tímida, em pé, centro das atenções, pois interrompemos a aula com a nossa chegada, sem saber o que fazer com as mãos, meti o dedo no buraco do tinteiro e qual não foi a minha surpresa quando verifiquei que meu dedo saiu azul! Ah! D. Iracema que vergonha! Só não fiquei de cabelos em pé porque usava tranças...


Cidadã benemérita de Morretes


A turma da Escola Normal do Estado (hoje Instituto de Educação de Curitiba) comemorou no mês de novembro p/passado as bodas de prata da sua formatura. Há 25 anos, portanto que aquelas moças idealistas iniciaram o sacerdócio do ensino, fazendo das crianças os homens do Brasil do futuro.
Entre as jovens daquela turma estava a Srta Iracema Bittencourt, filha do saudoso e honrado morretense Bernardo Bittencourt e de sua esposa também de saudosa memória D. Francisca Bittencourt.
Ingressando no magistério no ano de 1939, no Grupo Escolar Miguel Scheleder, a nova professora exerceu as suas funções até 1946. Nesse ano, a insigne mestra D. Maria Luiza Bertz Merkle foi removida, a pedido para a direção de outro grupo na capital do estado, e a professora Iracema foi investida no elevado cargo de Diretora do nosso principal estabelecimento de ensino.
Em todos estes anos houvesse D. Iracema com capacidade, inteligência, dedicação e senso de direção elogiáveis. É ela dotada de notável capacidade de trabalho e de estudos, tendo se formado Contadora no ano de 1958 e está cursando atualmente a Faculdade de Filosofia de Paranaguá. Acumula os cargos de Diretora do grupo e Inspetora do ensino primário, bem como o de professora do ginásio e da escola normal, de tudo se desincumbindo a contento e está sempre presente às iniciativas que visam o bem comum e o sentimento de civismo da nossa mocidade.
Portadora de esplêndida formação cristã a professora Iracema Bittencourt fez-se merecedora das homenagens que lhes foram prestadas na oportunidade do 25º aniversário de sua formatura. As educadoras morretenses fizeram inaugurar em sessão festiva o seu retrato no gabinete do grupo escolar. A Câmara de Vereadores fez-lhe entrega, em sessão solene, do título de Cidadã Benemérita de Morretes, e finalmente os amigos ofertaram-lhe um jantar.
Agradecendo aos que lhe saudaram a distinta morretense, com a voz embargada pela emoção, produziu belas orações.

*Artigo escrito por MLB e publicado em novembro de 1964

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Humberto Malucelli, o amigo

Meu pai, com todo o seu talento para se expressar, gostava de escrever e por três anos, de 1932 a 1935, foi colaborador do jornal Morretes Esportivo e do Eco Morretense. De 1934 a 1959 foi decano dos correspondentes do Diário da Tarde, Estado do Paraná e Gazeta do Povo, sendo admitido na Academia de Letras José de Alencar na categoria de Jornalista.
Ao organizar o material para publicação do livro Tenho dito; Morretes e Morretenses nos discursos de Marcos Luiz De Bona, resolvi incluir alguns dos seus artigos escritos para homenagear amigos da sua querida terra natal.



Humberto Malucelli


Da velha Itália, para ajudar a fazer a grandeza do Brasil, vieram os 6 irmãos Malucelli, no ano de 1876. Radicando-se em Morretes, Marcos, Batista, Lourenço, João, Antonio e Domingos não foram meros expectadores das lutas pela sobrevivência das famílias estrangeiras que desembarcaram julgando ser este país a Terra da Promissão. Eles sentiram como os outros a desproteção do governo, a dureza da terra, a adversidade do clima.
Uma dádiva, porem, trouxeram de além-mar: o amor pelo trabalho que foi a razão de ser de suas vidas.
A família foi se tornando numerosa; os seis irmãos, filhos do tronco JOÃO-MARGARIDA, foram se tornando por sua vez chefes de outras tantas famílias numerosas, constituídas em sua maior parte de filhos homens que hoje, já na terceira geração no Brasil, expandem o nome MALUCELLI como padrão de honra.
A família, no início, teve um chefe na figura patriarcal do velho Marcos. A sua atuação foi enérgica e serena, na condução daqueles que aos poucos, com trabalho continuado, deixando cair seu suor na terra dadivosa, levantaram o patrimônio extraordi´nário dos dias atuais.
Marcos Malucelli, que é hoje nome de rua em Morretes, faleceu no ano de 1929. Desde então, a Empresa, por sua organização, não mais requereu a existência de um chefe que fosse ao mesmo tempo chefe da família. Todavia, vários homens do clã destacaram-se pelos negócios e equilíbrio de conduta, merecendo situações de comando.
Há pouco faleceu Humberto Malucelli. Filho do sub-tronco JOÃO-MARIA, o seu desaparecimento causou dolorosa impressão no seio da família, onde sua voz, ponderada e sensata era acatada. A bondade era o traço predominante do seu caráter. O seu trabalho, desde os duros tempos da lavoura, até aos atuais onde exerceu cargos de direção nas indústrias e funções públicas de alta relevância, inclusive a de Diretor de Departamento e Deputado Estadual, foi sempre no sentido do bem comum, preocupado que sempre se achava na boa administração, na assistência social e no prestigiamento de toda e qualquer iniciativa de cunho coletivo.
Sua educação possibilitava o trato lhano e bondoso com todas as pessoas que dele se aproximavam; o seu grande coração fazia-o o chefe de família amorosíssimo de todos conhecido, junto de sua venerada mãe, de sua virtuosa esposa, prendadas filhas e queridos netos.
Mas para nós outros, das relações de amizade do saudoso Humberto, o vocábulo mais inesquecível será o de AMIGO. Porque junto dele este termo não era formal; este termo encerrava afeição; a dedicação e a estima a que se evidenciava tanto nas horas alegres como nas amargas dos que com ele conviviam.
A nossa saudade será grande, porém amenizada pela certeza de que temos que a memória de Humberto Malucelli será sempre reverenciada entre seus familiares, seus amigos e entre todos aqueles que se espelharem no belo exemplo de sua vida.



*Artigo publicado no livro Tenho dito, p. 185